No dia 31 de agosto é comemorado o Dia Internacional das Pessoas Afrodescendentes. O Brasil é um dos países que teve sua etnia, linguística, culinária, arte, cultura e sua maneira de ser formada também pelas influências de povos africanos. Uma das práticas que se tornou símbolo da cultura afro-brasileira é a capoeira.
De crime a patrimônio cultural, a capoeira destaca-se pela sua origem de resistência e proteção para povos africanos escravizados que viviam no Brasil colonial. A luta, que foi proibida durante séculos, teve de adotar movimentos de dança, e só passou a ser legalizada em 1937, sendo reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade em 2014.
A capoeira, ainda hoje, mantém a sua cultura de resistência. Remetendo à sua ancestralidade, ela participa do processo de constituição identitária não só de uma nação, mas também, individualmente. A educadora física e capoeirista, Ketlyn Almeida, 23, começou a prática ainda criança, com 11 anos, e com isso, começou a se enxergar enquanto mulher negra, a partir das canções e figuras importantes para a história da capoeira.
“Eu acredito muito no poder da ancestralidade, no sentido de reconhecer o que foi feito e poder valorizar o que está sendo feito e passar para frente, o que eu posso transmitir enquanto aprendizado, enquanto conhecimento. A minha construção enquanto capoeirista, ela se deu através de muitas coisas, de conhecimento teórico, de muito que eu estudei, de aula. Se deu através da minha construção enquanto mulher negra. Eu aprendi muito na capoeira de como se posicionar sobre hierarquia, sobre respeito, sobre identidade.” Comenta a educadora.
No início da sua trajetória no esporte, Ketlyn recebeu o apelido de Dandara, o mesmo nome da guerreira negra e esposa de Zumbi dos Palmares, um líder quilombola brasileiro. A cultura dos apelidos surgiu para proteger os capoeiristas na época em que essa luta era crime.
“Quando eu comecei a pesquisar sobre Dandara, eu comecei a achar várias outras mulheres. E quando eu achei várias mulheres eu me vi nelas. Por isso eu falo sobre identidade e representatividade. Assim como muitas meninas que começam a fazer capoeira podem, talvez, se ver em mim, que já atua há um tempo, eu me vi nessas mulheres quando eu comecei a pesquisá-las. E se deu a partir da Dandara. E aí isso casou muito com a minha pessoa. Estudando sobre elas, eu comecei a estudar sobre de que maneiras elas lidavam com opressão, com o machismo, com o racismo” acrescenta a capoeirista.
Ketlyn faz parte de uma escola com o nome de Centro Cultural Aruandê. Atualmente, ela está em uma graduação avançada que a permite tocar o berimbau, instrumento que rege a luta. Ela aspira no futuro se tornar uma mestre para poder inspirar outras meninas. Entretanto para isso é necessário, na sua escola, 30 anos de prática.
“Eu acredito que a minha ancestralidade, às pessoas que vieram antes de mim, pavimentou esse caminho para que hoje eu pudesse chegar numa roda de capoeira, tocar o berimbau, chegar numa palestra e poder falar com propriedade, chegar a aulas e poder literalmente dar aula de capoeira, que até então era proibida tanto por lei quanto a prática de mulheres. Esse esporte, essas pessoas que vieram antes são muito importantes e elas precisam sempre ser lembradas.”
Nesse sentido, a capoeirista ainda faz um alerta de que a capoeira também tem um espaço de luta interna, como o conquistado pelas mulheres pelo direito de praticar. “Mesmo sendo a prática da capoeira uma prática de resistência, ela ainda passa por situações racistas e muito machistas. Aí a gente precisa sempre pontuar que o mundo está mudando e coisas que antes eram normais, a gente não pode simplesmente reproduzir.”
Fonte: Da redação
Data: 31/08/2024